quarta-feira, 18 de maio de 2011

MEMÓRIA DOS OUTROS TAMBÉM É NOSSA?

No último domingo, dia 30 de maio, às 15 horas, na cidade de Vila Velha, em frente à orla de Itaparica, encontrei-me com B.  (o nome do entrevistado foi preservado), um imigrante tcheco que vive no Brasil a mais de 60 anos. Com 81 anos de vida e muitas histórias para contar, esse senhor presenciou vários acontecimentos marcantes na Europa e no Brasil.

B. nasceu em 1929, na cidade de Jirlava, localizado no interior da República Tcheca. Apesar de pequena, a cidade que possuía cerca de cinco mil habitantes, tinha as suas principais ruas asfaltadas e uma linha ferroviária. A cidade também foi um importante centro de confecção de sapatos para o império austro húngaro durante a Primeira Grande Guerra. A aquisição de uma simples bicicleta, no entanto, era privilégio para poucos moradores.

B. viveu sua infância na terra que a família possuía e praticava uma agricultura familiar. Sua família era composta pelos pais e nove filhos.  Ele era o sétimo filho, tendo duas irmãs mais novas. Seu pai exerceu a profissão de sapateiro.

Sobre sua educação, B. revela que a escola ficava perto de sua casa e as crianças estudavam no período da manhã. A tarde era dedicado a ajudar a família no campo. Até os 14 anos, fez apenas o estudo básico da época. Antes do cinema mudo, uma das formas de socialização dos jovens era uma outra forma de “cinema”, voltada para a doutrinação religiosa. Enquanto o padre ia projetando os santos, ao mesmo tempo ele falava sobre a história de cada um deles.

Dos seus 14 aos 19 anos, cursou o ensino técnico, seguindo o regime de períodos que já conhecia do ensino básico, em um internato. No período da manhã, até o meio-dia, dedica-se aos estudos. O resto do tempo era voltado para o aprendizado de uma profissão. Segundo B., na fábrica onde aprendeu o novo ofício, cujo dono era Yan Bata, produzia-se calçados e meias. Na época, estima-se que a produção chegada a cerca de um milhão de calçados por dia.

Um fato que marcou a adolescência de B. foi à ocupação que o seu país sofreu pela Alemanha Nazista em 1939. Antes da invasão germânica, ocorreu uma grande mobilização para enfrentar os invasores e defender a República Tcheca. “Não queria dar nem um palmo de terra para os alemães”, relembrou B. O governo da República Tcheca fez uma chamada convocando os moradores a enfrentar os alemães, quando os invasores germânicos tomaram o território dos sudetos, no norte do país, que era de minoria alemã.

B. conta que a República Tcheca também tinha um pacto em vigor com os aliados, neste momento formado pela França e Inglaterra de mútua proteção militar em caso de agressão por parte de Adolf Hitler. Mas, quando chegou à hora, eles se retiraram do acordo, deixando o país tcheco encurralado pela ofensiva alemã. Eles resistiram um pouco, mas acabaram cedendo.

Com o domínio proporcionado pelas invasões, os alemães pegaram para eles todo o poder bélico tcheco de mãos-beijadas: além de sua pátria ser muito bem equipada militarmente, possuía um sistema francês de armamento. B. lembra-se muito bem do local onde estava quando a invasão aconteceu: no internado. Foi de lá que viu os primeiros tanques alemães entrarem no seu país.

Durante esse período de ocupação alemã, estabeleceu-se um completo controle de todas as instituições pelos nazistas, sendo que a República Tcheca virou um protetorado alemão. Os operariados passaram a trabalhar nas fábricas para os invasores. No campo, os alemães não foram menos rigorosos e estabeleceram cotas em relação à produção que os agricultores tinham que entregar. Um exemplo foi a produção de leite. Os nazistas criaram uma medição em que cada litro de leite tinha que ter 3% gordura. Isto para garantir que os agricultores não estavam roubando está gordura para fazer outros derivados.

Um fato terrível que B. relatou foi sobre um massacre promovido pelos alemães, quando o Protetor da República Tcheca, um oficial nazista de nome Hyedrich, foi morto por membros da resistência tcheca. Para se vingar e mostrar o seu poder, os alemães mataram toda a população de uma pequena cidade de nome Licidia. Os soldados nazistas paravam nas estradas as pessoas que voltavam do trabalho no campo ou em áreas próximas a cidade. Os que eram de Licidia eram pegos e fuzilados. Ao contar esse episódio, B. conclui: “Pegou uma cidadezinha e fuzilaram todo mundo.”

Já no final da guerra, ainda no internato, o tcheco chegou a ver os aviões alemães e americanos se digladiando pelo controle aéreo da região. Com a eminente derrota, os nazistas saíram apressados e deixaram armas e carros com suprimentos para trás. Em uma estrada, os moradores encontram um destes carros abandonado pelos alemães, cheio de mantimentos, como lingüiça. A pressa dos nazistas, segundo B. , se devia a chegada dos russos, pois assim que os alemães passavam por uma estrada, logo atrás vinham os blindados russos. O tcheco recorda-se que os soviéticos prenderam uma coluna de alemães durante a retirada deles.
Sobre as armas deixadas para trás pelos nazistas, B. lembrou-se de dois episódios em que o envolveram. O primeiro foi quando ele e um grupo de amigos encontraram uma bazuca deixada pelos antigos invasores e decidiram brincar com ela. “Colocava no ombro. O fogo levantou, caiu nestas pedras, explodiu as pedras”. Às vezes, as brincadeiras não acabavam muito bem. Em outro episódio, quando estava perto de uma lagoa, o jovem Bohumil encontrou uma caixinha com bolinhas de mercúrio, colocou no bolso traseiro, e acabou perdendo. Outra pessoa encontrou e foi brincar com as bolinhas. Ao bater nelas, as bolinhas acabaram explodindo, relembrou o tcheco aos risos.

Com a retirada dos nazistas, o presidente no exílio da República Tcheca voltou da Inglaterra em 1945. Porém, logo em seguida os comunistas tchecos, com o apoio dos russos, tomaram o poder. Com o advento do novo regime, acabou-se com a propriedade privada, todas as fábricas foram estatizadas e tudo que era produzido ia para Rússia. Os que tinham dinheiro no banco, o governo pegava, deixando-os sem nada. Essa nova realidade acabou levando a um êxodo enorme de tchecos para outros países europeus.

Entre aqueles que preferiram sair do país estava B. aos 19 anos de idade. Em 1948, ao ver as inevitáveis conseqüências do comunismo na República Tcheca, ele acabou fugindo. Pegou um trem e foi sozinho até uma cidade fronteiriça com a Alemanha. Lá, passou uns dias na cidade, depois atravessou a fronteira alemã a pé, demorando cerca de uma hora até chegar a um acampamento das tropas americanas.

Segundo B. , o acampamento era como uma escola, com antigas casernas militares que os americanos fizeram de base para abrigar os refugiados que ali se aglutinavam. Lá também funcionava a Organização Internacional para Refugiados, entidade responsável por acompanhar essas pessoas.

A organização era formada por missões de vários países, inclusive o Brasil. A missão brasileira fazia uma triagem com os possíveis candidatos às vagas de moradia e emprego no país, atraindo o interesse de B. . Porém, antes de chegar ao Brasil, Bohumil passou por outros países europeus como Áustria e Itália.

Já no navio que o trouxe até o Brasil, durante toda a viagem, ele teve aula de português, junto com outros refugiados que não conheciam o nosso idioma. Ele chegou ao país brasileiro em 1949, durante o governo de Eurico Gaspar Dutra. Desembarcou na ilha das Flores, no Rio de Janeiro, onde existia outra filial da Organização Internacional para Refugiados. A cada seis anos ele tinha que renovar seu visto para continuar no Brasil.

No Rio de Janeiro, onde fixou residência, passou a trabalhar na indústria siderúrgica, e chegou a fazer vários cursos técnicos para se aprimorar na nova profissão. Com o fim do governo Dutra, ainda em 1949, ele acompanhou o segundo Governo Vargas, entre os anos de 1950 e 1954, e o suicídio do presidente. Quando questionado sobre o governo de Vargas e seu suicídio, B.  limitou-se a se dizer, sem querer se prolongar no assunto, que viu as pessoas nas ruas e acompanhou tudo.

Já sobre o golpe militar de 1964, o tcheco foi um pouco mais generoso em passar as suas impressões, relatando que viu os militares desfilarem pelas ruas e figuras históricas, como Carlos Lacerda. Em meio às recordações, B. faz uma confissão. Ele e um grupo que preferiu não identificar mandaram uma carta aos militares agradecendo-os por livrar o Brasil dos comunistas. Ainda segundo B. , a tal carta chegou a ser, inclusive, publicada em um jornal, que ele também não quis especificar.

Depois do Rio de Janeiro, B.  trabalhou um tempo em São Paulo ainda na área de siderurgia. No estado paulista, chegou a acompanhar um comício do folclórico líder populista Ademar de Barros, a quem o tcheco descreveu seu aspecto físico como “gordo glutão”. Ele ainda relembrou o famoso slogan de Ademar: “Rouba mais faz”, podendo ser está impressão uma formulação posterior de sua memória.

B.  chegou ao Espírito Santo para fixar residência em 1974. Ele já conhecia o Estado deste de 1970, uma vez que já tinha visitado a região em outras ocasiões. Em terras capixabas, trabalhou em uma empresa siderúrgica, a “Ferro e Aço”, até a sua aposentadoria.

À República Tcheca, B.  só voltaria com o fim do regime comunista. Quando abandonou sua pátria em 1948 era um jovem com menos de 20 anos e quando voltou, em 1997, era um idoso de 68 anos. Depois de quase cinco décadas, pode reencontrar seus irmãos e seus sobrinhos na República Tcheca. Até hoje, ele mantém contato com a família, graças à internet e as constantes viagens que faz a sua terra natal. Um de seus amigos, que estava presente à entrevista, me confidenciou que ele pensa em voltar para a República Tcheca, ficando sob os cuidados dos seus sobrinhos.

No seu reencontro com o país natal, B. percebeu que muita gente ainda sentia falta do regime comunista. Uma das explicações seria porque no antigo regime, as pessoas tinham uma estabilidade mínima. No regime comunista, os tchecos recebiam um subsidio para tudo, todos tinham direito a uma quantidade mínima para sobrevivência e bem-estar. Realidade muito diferente a que encontrou em sua primeira visita após sair do país, quando viu parques, empresas e oficinas fechadas.

Com a abertura da economia tcheca para o capitalismo, as multinacionais compraram as indústrias e as modernizaram. B.  lamentou essa mudança, dizendo que hoje, se trabalha fazendo produtos para os estrangeiros e os tchecos tornaram-se empregados em sua própria terra.

Apesar de admitir que parte da população sente falta do comunismo, B. explica que o comunismo tem uma grande responsabilidade pela situação econômica do país no pós-comunismo. Para ele, a Rússia, quando começou a produzir petróleo, modernizou suas fábricas e deixou as obsoletas para a República Tcheca, sem poder acompanhar o desenvolvimento dos outros países, visto que o país ficou isolado e não pode concorrer em outros mercados. B.  revelou ainda que a indústria de aço foi comprada pelo dono da Arcelormittal.

No final da entrevista, o tcheco fez diversas comparações entre o passado e o presente. Sobre a ditadura militar, comentou que havia mais segurança do que hoje, argumentando que na nossa atual sociedade, você sai para trabalhar e não sabe se volta. Sobre a situação da República Tcheca, faz uma alusão à Petrobrás para defender o capitalismo: “Todos os países têm que ter gente rica. Digamos que a Petrobrás fosse distribuída para cada um. Todo mundo ia tomar a sua cerveja. Mas cadê o capital?”, indagou. B.  também comentou sobre sua vontade de viajar mais pelo Brasil, mas acha meio inviável devido à falta de estrutura do país: “Viajar daqui a Belém você vai?”, ironizou.

Hoje, o tcheco B.  está aposentado, mas procura sempre fazer exercícios na praia, tomar sua cervejinha com os amigos e participar de campeonatos de xadrez, jogo que começou a praticar quanto ainda tinha 14 anos, nos temos que o seu país era um potente país fabricador de calçados e meias.



sexta-feira, 13 de maio de 2011

MEMÓRIA TEM GOSTO?

SABE...
QUANDO EU ERA CRIANÇA, NAS FÉRIAS EU IA PARA ANCHIETA, A CIDADEZINHA MAIS GOSTOSA DO MUNDO, TANTO QUE ATÉ HOJE GUARDO UM RETALINHO DELA NOS MEUS SONHOS.
VOLTANDO A ANCHIETA, QUANDO EU IA LÁ TUDO TINHA GOSTO, COR, CHEIRO E FESTA, EU IA COM MEUS AVÓS E NÓS, GERALMENTE ÍAMOS NAS FERIAS OU NO ANIVERSÁRIO DA CIDADE.
POR ESSES DIAS ESTAVA CONVERSANDO COM MADRINHA, NO MEIO DA CONVERSA ELA ME CONTADO COMO ESTAVAM AS COISAS ME VEIO A MEMORIA DO GOSTO DO LEITE DE VACA QUE O LEITEIRO, TRAZIA À PORTA, QUE MADRINHA SERVIA JUNTO COM BOLO DE MANDIOCA, E PÃO QUENTINHO FEITO NO FORNO A LENHA COM MANTEIGA.
O GOSTO DA MINHA INFÂNCIA VEM CARREGADA DE MEMÓRIA, E ESSA MEMÓRIA ATÉ DA ÁGUA NA BOCA. 
PARECE SEM LÓGICA ALGUÉM SÓ FALAR DE MEMÓRIA MAS GOSTARIA MUITO DE CONVIDA-LOS A CONHECER ESTAS FACETAS, JÁ QUE TRABALHAMOS COM MEMÓRIAS, GOSTARIA QUE SOUBESSEMOS COMO ELAS SÃO RARAS E CARAS PARA OS DONOS DELAS...NAS PRÓXIMAS POSTAGENS VOU TRAZER A MEMÓRIA ORAL DE AMIGOS, EM RELATOS QUE UM DIA GANHEI DE PRESENTE.
BJ


 




terça-feira, 10 de maio de 2011

PATRIMONIO

PATRIMONIO SEGUNDO A UNESCO É TODA E QUALQUER PRODUÇÃO CULTURAL MATERIAL OU IMATERIAL DE UM POVO QUE MERECE SER RELEGADA AS GERAÇÕES FUTURAS.
O QUE VOCÊ ENTENDE POR PATRIMONIO, E O QUE GOSTARIA DE DEIXAR PARA AS GERAÇÕES FUTURAS???

segunda-feira, 9 de maio de 2011

CHEIROS, GOSTOS, MEMORIAS

A MEMÓRIA É ASSIM UMA CONSTRUÇÃO.
CONSTRUIMOS MEMORIAS E SOMOS CONSTRUÍDOS POR ELAS, NO ÍNTIMO DE CADA SER HUMANO EXISTE UM IMENSO MUSEU, UMA IMENSA BIBLIOTECA, UM IMENSO ARQUIVO COM RIQUÍSSIMAS IMAGENS, CENAS QUE VIVEMOS COM INTENSIDADE E FICAM PARA SEMPRE GUARDADAS EM NOSSAS LEMBRAÇAS.
QUEM NÃO SE LEMBRA DO CHEIRO DE TERRA MOLHADA PELA CHUVA, OU DE BOLO DE FUBA COM ERVA DOCE EM FOGÃO A LENHA, HALITO DE BEBÊ OU DE CHEIRO DE CHOCOLATE E TEM TAMBÉM CHERINHO DE MÃE...VOCÊ SE LEMBRA DE ALGUM CHEIRO, SE LEMBRA ME CONTE E PARTILHE ESSA MEMORIA!